Ainda em relação ao Menino de Cabul, uma histórica verídica que, de facto, arrepia um pouco mesmo os pelinhos mais adormecidos, quem for ver procure aperceber-se da importância de um kite na felicidade de uma criança e de um homem... Eu tenho 3. Um pequenino, que parece uma ave. uma gaivota ao sabor da brisa do mar. Um grandito, que faz lembrar uma ave de rapina com hélices em voo picado sobre a presa (as hélices referem-se ao barulho que este papagaio faz, impressionante). Às vezes quando passa um avião em baixa altitude por cima de minha casa, penso que é alguém que me está a gamar o papagaio, mas não, lá está ele bem pertinho da minha cama. Gosto de saber que ao meu lado, que quando vou nanar está ali um bocadinho de mar, de céu, de praia e de liberdade bem perto. O terceiro, é um ganda maluco! Grandãoooo, imponente, 48 fios de 100 metros a apontarem os céus e o gigante adormecido lavanta voo... faz sombra no areal, ergue-se lentamente em direcção ao Sol, mas 1 segundo pode ser suficiente para escutar os nossos amigos úmero, rádio e cúbito a fazerem "crack". A última aventura ficou bem marcada na areia. Parecia uma praia atravessada por um tractor agrícola com uma charrua de aivecas das grandes. Neste caso, os meus pés fizeram de charruas. Posso até, numa próxima oportunidade, deixar o meu contacto para a Associação dos Jovens Agricultores de Portugal. Um dia vou tentar lançá-lo dentro de água, mas tenho medo de curto-circuito com as faíscas produzidas pelos calcanhares. Estes 3 papagaios são os meus 3 amigos de todo o ano e de todas as praias, uma união para toda a vida. Espero um dia ter crianças para justificar estes brinquedos do pai como sendo brinquedos deles e não passar algumas vergonhas quando abro a mala do carro e parece a fusão da Imaginarium com o Papagaio sem Penas e com a Decathlon.
A dependência do mar estimula-nos a abraçá-lo todos os fins de semana, de perto ou de longe. É, efectivamente nomeadamente mormente, um abrigo. Um abrigo de liberdade, de sonhos, de loucura, de água, de diversão, de brilho, de prazer, de expressão, de sensações a que o corpo responde com uma dependência cada vez maior. Muitas vezes, quando pensamos no mar e nos momentos de prazer que nos proporciona, há uma nítida tendência para associar o surf a este contexto. Há o grupo dos surfistas, como há o dos betos, dos xungas, dos skaters, dos punks, dos dementes precoces :) etc... Eu tive sorte de ser um independente nesta matéria. Sou eu, sem grupo. Lanço os meus papagaios, um dia, uma noite, sozinho ou acompanhado. E cada vez gosto mais. Mergulho e encontro um Mundo que todas as pessoas têm de conhecer. Ninguém pode partir sem mergulhar e "sentir" o que se passa lá em baixo... já não se muda! É deixarmos de ser "pessoas" e todos os problemas que isso traz e passarmos a ser "mar" e toda a grandiosidade que isso representa. É sermos aventureiros, mas de outro Mundo. Já fiz surf e bodyboard. Nunca me esqueço da primeira vez, com a minha velhinha prancha amarela do Continente. Poucos centimetros quadrados do meu corpo não faziam lembrar um tipo lá dos África. Não consigo apanhar ondas, é um facto, mas faço uma boa amizade com a prancha ao pôr do Sol. Já desloquei um ombro e não disse nada a ninguém, quando quis subir para uma tábua de madeira à beira mar só com um pé, e tentar chegar o mais longe possível. Já pareci um minúsculo pontinho no mar, visto da praia, sentado numa bóia enorme que anda sempre na mala do meu carro, ao lado da bola colorida. Todos os dias do ano. Já fiz xixi no mar. Já fiz o pino, cambalhotas, dancei, cantei, corri e adormeci no mar. Já acertei com um disco na cabeça de uma senhora de 80 anos, e ela até gostou. Já atirei muitos paus para o mar, para um bobi trazer de volta. Já escrevi um pequeno livro, enquanto assisti a duas marés. Já corri para os barcos dos pescadores que chegam e devolvi ao mar todos os peixes que consegui. Já apanhei conchinhas para oferecer à minha mãe. Já fiz de palhaço à beira-mar enquanto me procuravam no alto mar e nas dunas. Já fui feliz à beira mar, enquanto fazia de palhaço. Já desenhei corações na areia e vi-os serem apagados pelas ondas pequeninas. Já corri 200 metros até ao mar e tropecei 1 metro antes de lá chegar. Nunca mais corri até ao mar. Já saltei para o mar do cimo de um monte (vá lá... um montito... vá lá... uma muito pequenina elevação... pronto, de cima de um calhau). Já fiquei sentado à beira-mar a ver nascer a lua atrás de mim e o sol a esconder-se à minha frente. Já saí do mar com a lua lá em cima. Muitas vezes. Já brinquei com o mar todas as horas do dia e da noite, algumas vezes com o fato de banho :) Secalhar, já fui mar... Se o mar falasse, a cumplicidade que temos impediria a divulgação de outras actividades lúdicas que me fizeram rir, sonhar, amar... sempre ao pé do mar. E o melhor está para vir... ;)